FREEBIE EMOCIONAL

       
        Vocês viram aquele filme onde a mocinha tinha uma compulsão por comprar que detonava a vida dela? Ela não podia passar pela frente de uma vitrine que os manequins ficavam chamando ela. Pois é, confesso L... O Honny é assim! Não resiste a um freebie. Não eu, ele que é, entendem? Eu nem ligo, qualquer meio sculpt me satisfaz, mas aquele avatar é muito vaidoso e acha que é milionário. É dependente de um vendor, e foi uma luta ele se disciplinar. Deixa-me contar a vocês...

        Era uma vez um noobizinho chamado Honny que entrou no SL numa camisa azul ridícula, um jeans ‘volta ao mundo’ (marca da coisa mais perto de um jeans que existia no Brasil na década de 60, me contaram né) e um anêmico corpinho branco e franzino. Mas andava de lá pra cá no SL com aquele andar desengonçado de pato bêbado tentando entender o novo mundo. Ele nasceu numa tal MainlandBR que era habitada por seres muito esquisitos e descolados que adoravam por em prática suas técnicas de Bulling virtual com os novos, depois que de ficar preso num buraco, caminhar embaixo d’agua, apertar dezenas de teclas erradas para aprender a voar, levar orbits, ficar preso em celas e mais algumas dinâmicas do Kit Bulling deles, um dos novos ‘amigos’ explicou como pegar uma roupa oferecida naquela land.

         Ninguém sabia, mas naquele momento começou um dos grandes casos de amor (apesar de começar tumultuado como qualquer grande amor) do SL: o Honny e os vendores! A roupa oferecida era exatamente igual a que o Honny tinha. Fazia tudo certinho e a roupa não mudava. O que eu estava errando? Seguia o manual: acha no inventario, escolhe, clica em vestir, e... nada, a mesma camisa ridícula. Se outra novata não experimentasse e vestisse a roupa masculina no lugar do vestidinho dela, acho que estava lá até hoje! Bom, apesar desse contratempo, comprar foi uma paixão a primeira vista. Comprei umas trinta vezes a camisa e quarenta vezes a calça (ate hoje encontro algumas perdidas no inventario).

          Depois de muita cabeçada aprendi a me tele transportar e uma santa alma me deu uma landmark de um daqueles freebões enormes que tinha até couro de jacaré de graça. Ai foi uma maravilha, eu tinha o poder da ação de clicar com o direito e confirmar com o esquerdo, isso significou para o Honny o que aprender a ler significou para mim. Se ele aprendesse como não ficar com aquelas caixas grudadas no corpo, seria uma apoteose, assim depois que ele clicou em centenas de itens ele resolveu descobrir como quebrar aquela caixa.

       Enquanto eu esperava crescer (é, eu pensava que avatar fosse como tamagoshi que cresce com o tempo) ia tentando descobrir como tirar as coisas das caixas e numa certa hora entendi. Nossa foi o máximo, porém, era mais interessante pegar coisas e comecei a procurar lands de freebie sem nenhum critério. Conheci o tal MM e daí o anjo negro do consumismo tomou conta de mim! Passava os dias de land em land clicando e pegando até que um dia, já mais amadurecido, fui trabalhar em lands de ajuda. Como tinha uma sandbox, resolvi começar a desembrulhar meus cacarecos.

       Eu tinha milhares de itens que nem sabia para que pudessem servir, e a cada caixa que abria mais inchava meu inventário, porém, mentalmente eu achava uma desculpa para cada coisinha que abria. Meu serviço não rendia porque eu saia correndo cada vez que um notice entrava avisando que havia um freebie em algum lugar. Um dia, por algum problema meu avatar não conseguia carregar e alguém me disse que o tamanho do inventário influenciava isso, resolvi dar uma olhada como andava e me apavorei. Gente, que era aquilo? Eram milhares de objetos, pastas, coisas. Tinha que resolver isso. Determinei-me.

       Nós meninos, somos muito diferentes das meninas do SL nesse ponto, porque geralmente temos algumas roupas que gostamos, uns cinco pares de sapato e 3 ou quatro cabelos, enquanto a meninas... Comecei a tentar entender a mecânica econômica do SL, e vi que eu estava na direção contraria de tudo. No dia seguinte foi o inferno avatárico (?), o pobre Honny parecia suar vendo os notices convidá-lo para uma comprinha, parecia uma bela sereia enfeitiçando os marinheiros, mas manteve-se firme e foi abrindo caixas. Ninguém tem noção do que achei. Baby-dolls eram 18, sendo que eu nem sabia que isso existia! Chapéu de xógum, tatuagem de fadinha, camisetas de caveira, fantasia de borboleta, nossa parecia uma feira babilônica.   Ainda assim cada delete que eu dava me doía o coração.  

        Após alguns dias, uns 8 mil itens mais leve, eu achei que tinha controlado o vicio, sim controlado, porque ele continuava existindo. Mais centrado comecei a entender que nada é grátis no SL. Nada nem poderia ser, uma vez que tudo significa um trabalho e assim merece ser pago. Que isso Honny, você deve estar dizendo, eu posso ficar meses sem gastar um Linden! Pode sim, porém, isso seria antinatural. Minha historia não tem nada demais, é igual a milhares de secondilifeanos. Acho mesmo que todos passaram por isso, mas eu aprendi duas lições  importantes com essa história.

         A primeira é que o SL é uma sociedade capitalista, que com raríssimas exceções, para tudo é atribuído um valor. Construtores, criadores, designers, e todos os profissionais que se envolvem em criar para o SL o fazem visando lucro e não apenas o brilho em nossos olhos quando ganhamos. Nessa sociedade a circulação de valores é vital, como a circulação de um corpo vivo, sem ela nunca haverá saúde no corpo. Vivo me deparando com pessoas que discursam a obrigatoriedade de tudo grátis e doado no SL, que é obrigação da Linden Lab. e que dezenas de jogos são assim e patati patata, parecem beatos encima de caixotes.  Ok, eu respeito a idéia de cada um, mas isso nunca acontecerá. É mais provável o apocalipse! O que faz existir um progresso de tecnologia, uma sintonia com a mentalidade das pessoas, um acompanhamento das modas é o diferencial que o SL oferece de permitir que as pessoas criem  dentro do “jogo” e com isso lucrem. O Freebie de boa qualidade é um presente para que você conheça o produto daquele criador e se torne cliente dele. Quanto aos freebões, são produtos em sua grande maioria, ultrapassados (ou os produtos ou os criadores), que repassam gratuitamente.

        Por isso não é natural que você apenas sobreviva no SL de freebies, mas é possível sim, com paciência, boas dicas, perseverança e conhecimento da qualidade do que é oferecido. O natural é de vez em quando por a mão no bolso e gastar uns lindens, afinal com o valor de uma carteira de cigarros e uma cerveja, você deixa seu avatar com a cara do Brad Pitt ou da Angelina Jollie. Mas uma boa iniciativa é deixar pelo menos um agradecimento e um comentário ao criador e a quem deu a dica. Pelo menos boa educação não custa nada...

      A outra lição é mais profunda e diz respeito ao que carregamos em nossas mentes e hábitos. Um dos maiores bloqueadores da fraternidade humana é o hábito que temos de possuir, acumular e se apegar as coisas materiais. Desde criança somos condicionados ao possuir, ao comprar, ao acumular sem nenhum critério, e com a mídia bombardeando nossa cabeça com conceitos consumistas, chegamos num ponto que não mais agimos com liberdade e ficamos cegos quando vemos uma pechincha. Não ri não, você também é ou foi assim. Lembra-se dos 1,99? Quem não ficou com a casa entulhada de coisa que não precisava? Quem não tem essa bagulhada toda guardada numa caixa em algum lugar? Quem não tem trocentas peças de roupa que não cabem mais ou que estão demodê? (ui, essa é velha). Temos a humana mania de nos apegar as coisas materiais e juntar entulho.

      Pior é que isso também acabou influenciando o emocional das pessoas, e hoje quantos de nós não vive com a mente e o coração cheio de 1,99, sentimentos, relações, mágoas de baixíssima qualidade que continuam ocupando lugar? Meu blog não é de autoajuda, mas posso dizer isso a vocês: Usem do SL como plataforma de autoconhecimento e olhem seu inventário mental e emocional. Sabe aqueles amores freebies que você abriu a caixa e não gostou? ta lá dentro! Sabe aquela bronca que seus pais deram injustamente? Ta lá também. Sabem aquela resposta malcriada que seu marido deu numa hora de raiva? Ela é uma fantasia de borboleta do seu inventário mental e muitas vezes, por você não deletá-la, não consegue logar no seu casamento. Gente, se você estiver com as mãos cheias de cacarecos não poderá pegar novas, coisas boas. O que não presta não deixe no inventário, as coisas não vão mudar e aquilo passar a prestar. Solte, delete, dê, queime, exorcize. Acredite que o SL pode te ensinar muito sobre a natureza humana, é só parar para analisar. Com licença, um notice com uma calca show, fuiiiii!

Ah, Paz e Bem a Todos J   

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